O Hospital Psiquiátrico de Luanda possui 274 doentes abandonados, dos 384 internados, situação que preocupa a direcção desta unidade, lamentou, esta segunda-feira, a directora-geral da instituição, Antónia de Sousa.
Em declarações à ANGOP, adiantou que o número de pacientes abandonados pelas famílias vem crescendo ano após ano e cerca de 71 porcento dos doentes nessa condição se encontram no hospital há mais de 10 anos .
A responsável lamenta o cenário e refere que este abandono é maior em pessoas com doenças infecciosas e do fórum mental.
“Esta situação é bastante complicada. Em alguns casos, os familiares só aparecem no hospital para levar o boletim de óbito e preparar o funeral”, desabafou .
A mesma realidade em outras unidades
No Hospital Américo Boavida, cerca de 14 pacientes estão abandonados pelos familiares, sendo na maioria jovens.
O assistente social da unidade sanitária, Wuawua Pedro, que avançou a informação, disse que tem sido difícil convencer as famílias a levar estes parentes para casa após a alta médica, criticando o facto de alguns estarem no hospital há mais de 8 anos.
Fez saber que muitos pacientes são portadores de doenças contagiosas, o que acaba por influenciar negativamente na aceitação deles no meio familiar, por erroneamente conceber a forma de transmissão das doenças.
O assistente social do Hospital Josina Machel, Alfredo Kilulu, afirmou que as razões são inaceitáveis e têm muitas dificuldades em localizar os familiares porque alguns dão endereços falsos.
“Chegamos a ter casos de familiares que tentam oferecer até dinheiro para manter o seu parente no hospital, mesmo depois de alta médica e demonstração de boa recuperação “ realçou.
Relato de pacientes abandonados
Quem partilha dessas angustia são os pacientes Dário de oliveira e Maria Paiva, internados no hospital psiquiátrico a mais de 15 anos.
Segundo Dário Oliveira, mesmo após o título de alta médica, a sua mãe preferiu mantê-lo no Hospital para supostamente preservar o seu casamento.
Triste com a situação em que se encontra, o jovem, que sonha ser engenheiro, implora pela atenção da família .
Quem também desabafou foram os jovens João da Costa, de 30 anos, e Benvindo Miaca, de 29 , ambos internados no Josina Machel.
A João da Costa foi amputado a perna e está no hospital há três anos , já Benvindo Miaca, músico e vocalista da banda Olímpia, a caminho de seis anos.
Sem saberem das razões e a procura de respostas , ambos demonstram uma profunda tristeza e abandono .
Paula Eliane, de 26 anos, está internada na psiquiatria há um ano e, ao receber alta e voltar para casa, foi expulsa pela mãe, vendo-se obrigada a voltar ao hospital por alegadamente não ter onde viver.
Apesar de não receber visitas dos familiares, Paula carrega a esperança de que um dia tudo isso venha a terminar.
Sociólogo aponta causas
Para perceber melhor as razões desse fenómeno, a ANGOP ouviu o sociólogo Euclides Lopes, para quem, entre várias causas, os problemas sócioeconómicos e a quebra de valores nas famílias são as razões de fundo para esta problemática.
Afirma, porém, que, à margem deste abandono, muitos são os pacientes que também preferem permanecer no hospital por terem uma alimentação regular e um leito para dormir.
Para si , a família deve ser o primeiro e o principal grupo sóciocultural, promotora da saúde e do bem estar do seu parente.
Riscos da permanência nos hospitais
Para a médica infectologista, Maria Mateta , a permanência do paciente no hospital, após a alta médica, acaba por retirar a possibilidade de outro doente ocupar aquele leito, submetendo-se a vários riscos de contrair infecções .
Acrescenta que a atitude de muitas famílias em transferir as suas responsabilidades para o hospital traz consequências, não só administrativas, como psicológicas.
Fonte: Angop