Determinantes sociais estão na base do aumento de casos nas unidades sanitárias devendo-se redobrar os esforços para a melhoria do saneamento básico nas comunidades
Cerca de 20 milhões de cidadãos procuram, todos os anos, os serviços de saúde do país, em busca de assistência médica.
Os dados foram tornados públicos, segunda-feira, em Luanda, pelo especialista em Saúde Pública, Jeremias Agostinho, acrescentando que o referido número corresponde a mais de 70 por cento da população.
Em entrevista ao Jornal da Angola, Jeremias Agostinho explicou que o número de cidadãos que procura pelos serviços de saúde em busca de assistência médica é elevado, porque, infelizmente, os angolanos ainda adoecem muito por conta das determinantes sociais do país.
Na entrevista, feita a propósito da “certificação dos médicos de família”, aprovada pela Assembleia Nacional, no dia 3 de Janeiro, o especialista afirmou que o desemprego, a falta de saneamento básico, o uso de alimentos não saudáveis e habitações precárias estão na base de várias doenças que afligem os angolanos.
“Só para termos noção, 70 a 75 por cento dos motivos para a procura dos serviços de saúde estão relacionados com a malária, que é a principal causa de internamento e de mortes a nível do Sistema Nacional de Saúde”, sublinhou.
Segundo Jeremias Agostinho, a malária tem como principal causa o deficiente saneamento básico, que, se não for resolvido com urgência, grande parte da população vai continuar a correr para os hospitais em busca de assistência.
“Há, também, a questão da tuberculose, doença relacionada com a má alimentação, habitação precária, falta de zonas de lazer e de exercícios físicos. Estes determinantes sociais têm um impacto negativo na qualidade de vida das pessoas”, explicou.
Para o especialista, se aos factores mencionados for adicionada a falta de médicos a situação de saúde dos angolanos só piora, por isso, frisou, as pessoas enchem os hospitais, os profissionais ficam sobrecarregados, os medicamentos acabam rapidamente e os meios hospitalares se estragam com facilidade.
Como consequência dos aspectos acima citados, segundo o especialista em Saúde Pública, começam a surgir queixas de falta de humanização e mortes constantes, porque a procura pelos serviços de saúde é maior em relação ao número de médicos.
Jeremias Agostinho é de opinião que, se os determinantes sociais não forem resolvidos com urgência e de forma multissectorial, não será possível fazer com que os angolanos adoeçam e pressionem os hospitais cada vez menos.
Questionado sobre o número de médicos existentes no país, disse existirem menos de dez mil, dos quais 70 por cento concentrados em Luanda, o que faz com que três a quatro tenham que atender dez mil habitantes, um rácio muito desequilibrado, tendo em conta as regras exigidas pela Organização Mundial da Saúde (OMS).
Jeremias Agostinho informou que a OMS orienta que haja em países em vias de desenvolvimento, pelo menos, um médico por cada mil habitantes e nos países desenvolvidos, a regra é de três a quatro médicos por mil habitantes.
Acção do Ministério representa 30 por cento
O Ministério da Saúde intervém, apenas, em 30 por cento na resolução dos problemas de saúde dos angolanos, devido aos determinantes sociais, segundo o especialista em Saúde Pública, Jeremias Agostinho.
O médico defende uma acção multissectorial, com o envolvimento de todos os ministérios. “O tratamento que se dá ao lixo, por exemplo, principalmente em Luanda, está errado. O lixo não pode ficar exposto na rua, porque as moscas e outros insectos transportam doenças”.
A título de exemplo, disse que uma mosca após pousar no lixo, transporta cerca de um bilhão de bactérias que vão parar em residências, onde há comida, o que causa diarreia e vómitos.
Na visão de Jeremias Agostinho, como países vizinhos estão a registar muitos casos de cólera, Angola corre sérios riscos de vir a ter a doença, porque o saneamento básico e a água para beber ainda inspiram cuidados.
Médicos de família
“É olhando para a prevenção que o Ministério da Saúde tem estado a trabalhar com a Assembleia Nacional para que a figura do médico de família seja aprovada, a fim de se reduzir as enchentes nos hospitais e as mortes”, disse o especialista em Saúde Pública, Jeremias Agostinho.
A medicina geral e familiar, acrescentou, é uma especialidade cuja responsabilidade é o atendimento de carácter preventivo aos membros de uma família. De acordo com o especialista, os médicos de medicina geral e familiar evitam que o indivíduo adoeça e fica sempre muito mais barato para qualquer sistema de saúde, porque o trabalho desenvolvido por eles está mais virado à assistência preventiva.
O médico explicou que na comunidade e dentro de cada família, estes profissionais atendem os recém-nascidos, crianças, adolescentes, jovens, adultos e grávidas, sendo consideradas as figuras mais importantes dentro de qualquer sistema de saúde, por serem treinados para ir ao encontro das famílias nas suas casas e identificar qualquer problema que possa colocar em risco a saúde.
“Como o trabalho dos médicos de família é fazer visitas regulares, dificilmente as doenças evoluem para casos graves”, sublinhou, explicando, por outro lado, que nas unidades de saúde serão, apenas, encaminhados os casos que exijam acompanhamento de especialidade, para, desta forma, reduzir as enchentes nos hospitais, os profissionais trabalharem de forma mais leve, os pacientes serem melhor assistidos e as mortes reduzirem significativamente.
Fonte: JA